#13 Mães há muitas! – Mãe com Cancro!

A vida prega-nos muitas partidas! Imaginem-se mães de um recém nascido, com problemas de saúde e em simultâneo na luta contra o cancro! Quando pensamos em ser mães, imaginamos quartinhos rosa ou azuis, bonecos, estrelinhas, fraldas de pano e coisinhas fofas. Não imaginamos corredores de hospital, tratamentos, gessos, medicações, exames… A Paula não teve hipótese… A vida encarregou-se de lhe “roubar” o melhor momento da sua vida! Ainda assim, ela não desiste. Sendo lutadora e detentora de uma resiliência inigualável, ela luta diariamente para aproveitar ao máximo e sempre com boa disposição aquilo que a vida lhe quis roubar!

Apresento-vos a Paula:

*Quem é a Paula, além de Mãe do Quim?!
Tenho 33 anos, sou de Lisboa mas com muitas costelas Algarvias. Gosto muito de fotografia, queijos e vinhos numa boa companhia. Para mim as memórias têm cheiros e sabores e por isso gosto dos amigos reunidos numa boa mesa. Adoro uma boa gargalhada, abraços apertados e beijinhos repenicados.

*De onde surgiu a "alcunha" do Quim, o "pintainho"?
O Quim quando nasceu era muito pequenino, tinha 42cm. Enquanto estive grávida chamava-o de “Bichinho”, mas quando olhei para ele a primeira vez, vi que era amoroso e eu transformei-me uma mãe galinha e ele era o meu pintainho.

*O Pintainho nasceu com Pé Boto Bilateral e uma Hidronefrose grave à direita, estes nomes complicados abalam qualquer mãe, como reagiste à noticia?
Passámos um ano a tentar engravidar depois de ter-mos perdido um filho às 12 semanas  seis anos antes. Este foi um bebé muito desejado e ter ultrapassado as 12 semanas de gestação foi uma vitória, era um marco e eu tinha conseguido.
Inicialmente a hidronefrose era bilateral, mas com o evoluir da gravidez o rim esquerdo foi recuperando. Descobrimos na primeira ecografia morfológica às 22 semanas de gestação. Na nossa inocência ia-mos só saber o sexo do bebé. Foi como se nos largassem uma bomba ao colo. Foi horrível! Chorei rios à porta da clínica, não conseguia sequer falar. O Super-Homem chorou comigo, mas rapidamente se recompôs muito por minha causa creio, apesar de as duas patologias lhe serem completamente desconhecidas. Salvou-nos uma amiga que apareceu para fazer uma eco (também ela grávida) e que nos conseguiu acalmar.
Apesar de ter um irmão com Pé Boto, nada nos prepara para uma notícia destas. Aqui senti verdadeiramente o peso dos genes e era eu a portadora, o que me pesava ainda mais.
Passámos o resto da gravidez de coração nas mãos e sem saber o que o dia seguinte nos reservava.

*O teu parto foi induzido por suspeita (que se veio a confirmar) de Carcinoma maligno (Cancro da Mama), sentiste que te "roubaram" um dos momentos felizes da tua vida?
Sem dúvida. Foi essa a minha exata descrição quando a psicóloga me perguntou o que sentia.
O que deveria ser o dia mais feliz das nossas vidas transformou-se em algo pesado. O pintainho nasceu e foi como se não nos fosse permitido festejar em pleno, porque tinha-mos uma sombra atras de nós. Entre nós existia um silêncio aterrador, não queríamos falar nem pensar sobre o assunto e tentámos desfrutar ao máximo daqueles primeiros momentos, mas faltou muita coisa. A vida estava-nos a fugir e não podíamos fazer nada.
Apesar de não saber o resultado da biopsia, não me deixaram amamentar. Tiraram-me o pintainho dos braços e deram-lhe um biberon quando eu disse que ele devia ter fome. Não me disseram nada e eu também não tive coragem de perguntar. Limitei-me a assistir de longe e engolir o choro que tinha preso na garganta. Tive de arranjar uma forma de substituir aquela lacuna e encontrei no colo esse conforto. Dei e dou muito colo, na esperança que ele não sinta falta de nada, porque eu vou sentir sempre.
Os médicos sabiam bem do que desconfiavam, nunca me o disseram. Diziam só que estavam muito preocupados e que não queriam perder tempo. Eu, que parece que tenho um sexto sentido para estas coisas tive sempre a certeza que seria um cancro. Tanto alarido só podia ser um cancro.

*Dizes que não ter cabelo é horrível, porquê?
O cabelo faz muita falta. Não é só uma questão de imagem mas também de conforto. O frio que se sente é indescritível, é como se tivesse “o termómetro avariado”, se está frio temos muito frio e se está calor temos muito calor. Percebi que os pêlos em geral fazem falta na regulação da temperatura.
Uma cabeça rapada é sinal de doença, e não é uma doença qualquer, é uma doença que mata e que nos destrói aos poucos. Rapar a cabeça é encarar que de facto estamos doentes, afinal aqueles exames eram mesmo meus e não se enganaram, afinal sou mesmo eu que tenho cancro.

*O Cancro aproxima ou afasta pessoas?
As duas coisas.
Quem se aproxima é genuíno e sofre comigo, é uma doença de todos os que me são próximos.
Comparo muitas vezes quem se afasta a quem não vai a funerais. Não vão porque não é aquela imagem que querem guardar. E não os critico e não acho que se afastem por mal.
Digo muitas vezes que tudo é permitido, rir, chorar e até permanecer em silencio, é o que lhes apetecer porque vale tudo. Tenho quem não diga nada e só me abrace, tenho quem venha só para dizer disparates. Adoro cada um deles e agradeço por fazerem parte da minha vida.

*Tens um Super-Homem, é ele o teu pilar nesta luta?
Proibiu-me de morrer. Disse-me que não estava autorizada a morrer.
É o meu grande pilar, é quem me dá força e me lembra o que há de bom na vida quando me vou a baixo. O Super-Homem deixa-me chorar e ir a baixo, mas não me deixa lá estar muito tempo. É por ele que vou aos tratamentos e que aguento os poucos efeitos que tenho, é por ele que esta tentativa de cá permanecer valha a pena.
Apesar de ter a certeza que o pintainho ficava bem entregue, nos dias maus, quando me pergunto se valerá a pena e penso em morrer, rapidamente esqueço, tenho a voz dele gravada na minha cabeça a proibir-me. Ao fim ao cabo ele não merece isso, não merece ser portador de tal notícia e ficar com esse peso às costas. Ele merece tudo de bom.

*Os palpites, dicas e conselhos sobre a tua saúde, ainda que sejam com boa intenção, ajudam-te ou na verdade são mais chatos que outra coisa?
Acho que os palpites são sempre bem intencionados, e tenho uma grande dificuldade em não parar e ouvir as pessoas e agradecer no final. Tenho pessoas a minha volta que não sabem o que dizer e como reagir, por isso dão palpites...
A maioria são palpites bons, ou pelo menos fazem sentido. Recomendaram-me coisas bastante úteis, como uma determinada água engarrafada, ou um creme para as pernas, lavar as mãos e pés com vinagre por exemplo. São dicas que me têm ajudado.
Os palpites chatos são a maioria da vezes "a banha da cobra" e vêm de pessoas que na realidade não me conhecem. São chatos mas agradeço na mesma. Se a pessoa está a fazer este esforço merece um agradecimento, mas rapidamente os esqueço e sigo em frente.

*Sentes que a vida está a pôr-te à prova?
Sem duvida. É um teste como eu nunca sonhei vir a ter, nem nos meus piores pesadelos. Não me está a por a prova só a mim, quem me rodeia também está a ser testado. Aprendi muito nos últimos meses. Vi que não me enganei em relação aos que me rodeiam. Como costumo dizer: a vida era tão boa e eu não sabia.

*Onde é que vais buscar energia para ser Mãe, paciente de Cancro, escrever um blog e tudo isto com boa disposição? (A Paula é autora do blog Relativamente Comum)
No espaço de sete dias fui mãe e passei a ser doente oncológica. Não me deram tempo para pensar sequer, quando vi já estava a fazer quimioterapia. Senti que a vida estava suspensa e que  estava do lado de fora a assistir. Como nos filmes, em que a pessoa morre mas o espirito fica a assistir a tudo sem sem visto.
Com o passar dos dias, percebi que tinha de arranjar qualquer coisa para fazer enquanto o pintainho dormia. Era nessas horas que me ia a baixo. Vi no blog um diário, onde podia mostrar às pessoas que a vida até pode ser boa mesmo com todas estas coisas "relativamente comuns". Confesso que nunca pensei ter tantos leitores...
A energia vem do apoio que tenho. Tenho uma família e amigos fantásticos e que têm estado sempre aqui. O facto de não conseguir controlar tudo o que nos tem acontecido, faz com que muitas vezes se encare estas adversidades com boa disposição e alguma paz de espírito. Não há nada que eu possa fazer para mudar o que nos aconteceu, e porque não passar a mensagem de forma leve e dar às pessoas uma noção "do outro lado".

*Acreditas que o Destino ainda te vai compensar um dia?
Olho para o destino como o amanhã. Não penso muito mais além disso. Hoje sei eu compensou e amanhã certamente vai compensar. Não faço planos a longo prazo porque não sei se cá estou.
Vivo um dia de cada vez e hoje sou muito grata por ter na minha vida as pessoas que tenho. O sorriso do meu filho vale tudo. É isso que importa.

*Achas que sabes ser Mãe?!
Tento e pergunto muitas vezes ao Super-Homem se acha que faço um bom trabalho e peco-lhe sempre para me avisar quando achar que não. Quando não consigo peço ajuda e não me acho pior por isso. Sei que erro (claro que me culpo) mas acima de tudo dou o meu melhor e sigo o meu instinto. Tento não ficar ansiosa e responder sempre às necessidades do pintainho.

Sei ser a mãe que o pintainho precisa hoje, amanhã começo de novo.


Comentários

  1. Ena!... Desejo, do fundo do meu coração, que tudo corra bem. Eles merecem!...

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